Dinastia de leiloeiros rurais é preservada há 58 anos

Marcelo Silva, representante da terceira geração da família que introduziu os leilões no Brasil, resgata o legado deixado pelos seus antecessores

Marcelo Silva, representante da terceira geração da família que introduziu os leilões no Brasil, resgata o legado deixado pelos seus antecessores

Manter vivo um legado familiar é assumir a continuação de sonhos e de valores passados de geração para geração. Muito mais do que genética ou riquezas materiais, as principais heranças que uma pessoa pode receber são os ensinamentos e os exemplos deixados pelos seus antecedentes.

O leiloeiro rural Marcelo Indarte Silva é um discípulo que seguiu as lições e os caminhos desbravados pelos mestres da família. Hoje, é ele quem está na condição de mestre e inspira os sucessores a não deixarem o “martelo” cair!

Marcelo Indarte Silva: vocação para leiloar, inspirar e ensinar

Natural do município gaúcho de Uruguaiana, Marcelo Silva nasceu no dia 7 de junho de 1954. É o filho primogênito de Ethel Palmira Indarte Blengio e Trajano Antônio de Lima e Silva. Marcelo tem mais cinco irmãos: Amanda, Osvaldo, Andréa, Cláudia e Manoel.

Marcelo Silva no colo da mãe, Ethel Palmira Indarte Blengio

Marcelo Silva desde criança sonhava ser leiloeiro rural

O pai de Marcelo, o saudoso Trajano Antônio de Lima e Silva, é considerado um ícone no mundo dos leilões. Trouxe para o País essa modalidade de vendas que revolucionou a pecuária nacional, impulsionou o melhoramento genético e ajudou a estabelecer valores para o gado brasileiro. Em 1960, ele começou a leiloar e um ano depois, fundou a primeira leiloeira rural do Brasil: a Trajano Silva Remates, em Uruguaiana (RS).

Trajano Silva: baluarte dos leilões rurais no Brasil

Além de se espelhar no pai, que foi um grande mestre e deixou um legado sem precedentes para o setor agropecuário, Marcelo Silva também se inspirou nos avós. O materno, Marcelino Indarte, era leiloeiro rural no Uruguai, e o paterno, Flodoardo de Lima e Silva, era proprietário da Cabanha Julieta, em Uruguaina (RS), onde criava as raças bovinas angus e hereford.

Marcelo Silva com seu avô Marcelino Indarte, o primeiro leiloeiro da família

“Relembrar a minha infância é falar de uma fase de muita paz, felicidade e tranquilidade. Minha vinculação com o campo, a natureza e os animais vem desde que eu nasci. Morei seis anos na fazenda do meu avô materno, no Uruguai. Ele também era o meu padrinho e me ensinou muitas coisas sobre o meio rural. Foi um homem que fez história como leiloeiro uruguaio. O meu avô paterno era criador de gado e um grande apaixonado pela pecuária. Os dois eram muito dedicados e possuíam um tino comercial impressionante. Já o meu pai foi um desbravador dos leilões em solo brasileiro. Ele sempre foi um grande exemplo de retidão para mim, tanto como leiloeiro quanto como homem. Era uma pessoa íntegra, batalhadora, visionária e transparente. Nunca fez distinção entre os clientes. Tratava a todos igualmente e com muito respeito. Sempre o acompanhei nos remates e observava com atenção a sua maneira de comandar as vendas. Ele tinha raciocínio rápido, uma excelente memória, conhecia profundamente o que ia vender, tinha empatia com o público e falava um português corretíssimo. Mesmo com pouca idade, eu já sabia que o trabalho dele teria uma continuidade, pois o amor pela “tribuna” e pelo “martelo” estão no meu DNA. Sou a terceira geração de leiloeiros rurais da família. E ao longo dos meus 63 anos de vida, o que mais me deixa orgulhoso é saber que o meu filho caçula, Gonçalo Silva, dá sequência à essa dinastia que está na quarta geração. Tenho mais duas filhas que também atuam na Trajano Silva Remates: a Graziella, que é pisteira eletrônica, e a Karina, que cuida da sonorização dos leilões” declara Marcelo Silva.

Marcelo Silva com o pequeno Gonçalo Silva, aos 2 anos de idade

Tal pai, tal filho: terceira e quarta gerações de leiloeiros rurais

Graziella Porto Silva: a voz feminina de uma pisteira com estilo próprio de captar lances

Karina Porto Silva: a DJ da família Silva

Em 2001, pós leilão, Marcelo recebe abraço carinhoso dos filhos Gonçalo e Graziella

O INÍCIO DA CARREIRA:

Com apenas 12 anos, Marcelo Silva começou a atuar como pisteiro nos remates comandados pelo pai e aos 18 anos de idade, pela primeira vez, bateu oficialmente o martelo no Leilão de Liquidação de plantel da raça Polled Hereford, do criador Ary Saldanha Rodrigues, em Uruguaiana (RS), no dia 11 de junho de 1972.  “Me recordo como se fosse hoje. Estava nervoso e preocupado, pois tinha a missão de leiloar um material genético muito importante. O recinto estava lotado e, aos poucos, fui ganhando confiança. Mas só respirei aliviado quando terminou o remate e vieram me parabenizar pelo trabalho”, relembra Marcelo Silva. Quem pensa que o início foi fácil, engana-se. Para ter a certeza de que ele estava mesmo preparado para seguir a profissão, seu Trajano Silva fez com que o filho passasse por uma prova de fogo e vendesse suínos, galinhas e até coelhos. “Foi uma experiência muito válida e com isso o meu pai queria mostrar que a humildade é fundamental. O sucesso seria uma consequência e um guri tão jovem como eu em hipótese alguma poderia ficar se achando. Com isso, acabei tendo um conhecimento mais amplo, pois além de animais das mais variadas espécies, eu também leiloei quadros, prataria, antiguidades… A maioria desses eventos era beneficente. Antes disso, também atuei como pisteiro, que considero primordial para todos àqueles que almejam ser leiloeiro rural. É por essas e outras lições que eu sempre digo que me espelhei no meu pai em todos os sentidos, não apenas na área profissional”, conta Marcelo Silva.

Mestre e discípulo: Marcelo Silva no início da carreira, na década de 70, ao lado do pai Trajano Silva

Túnel do tempo: O jovem Marcelo Silva leiloando Brasil afora

1986: Marcelo Silva atuando no 1º Leilão Raça e Função

TRAJETÓRIA PROFISSIONAL:

Com mais de 40 anos de profissão, Marcelo Silva já percorreu 13 estados brasileiros e alguns países vizinhos, como Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai. O leiloeiro rural, formado em agronomia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), conta que já perdeu as contas de quantos remates comandou. Atualmente, a média varia entre 30 e 40 leilões por ano. “Eu contei até os dois mil. Depois deixei de enumerar. Hoje, não faço a mesma quantidade de leilões que fazia anos atrás, pois o Gonçalo vem assumindo boa parte dos remates da Trajano. E eu asseguro, sem nenhuma falsa modéstia, que ele é o segundo melhor leiloeiro do Rio Grande do Sul”, afirma Marcelo Silva.

Gonçalo, Trajano e Marcelo Silva: três leiloeiros símbolos de diferentes gerações

Apesar de já ter trabalhado muito, Marcelo Silva não considera que leiloar seja um ofício e garante que tem fôlego de sobra para continuar regendo muitos leilões. “O que mais me fascina nessa profissão é o contato com o público. Essa sensação de ser o maestro que comanda um grande espetáculo. Quando estou leiloando não sinto que estou trabalhando, pois estou fazendo aquilo que mais gosto na vida. Quando me perguntam se eu penso em passar o martelo eu digo que ainda sou um guri e tenho muito tempo pela frente. No mínimo, mais uns quinze anos”, confessa Marcelo Silva.

Marcelo Silva: “Quando estou leiloando sinto-me um maestro no comando de uma grande orquestra”

RECORDAÇÕES INESQUECÍVEIS:

Momentos felizes na linha do tempo não faltam. Na primeira vez que Marcelo Silva comandou um remate junto com o pai foi chamado de “Príncipe dos Leilões”. O apelido carinhoso foi dado por um criador de cavalo crioulo (Flávio Ventura) e até hoje ele se sente honrado com o título. Os anos passaram e ao chegar 2001, Marcelo se emocionou ao presenciar o início da trajetória de seu filho, Gonçalo Silva, como leiloeiro. Em 2002, comemorou a conquista do Troféu Guri, um prêmio dado pela Rádio Gaúcha às principais personalidades do agronegócio. Em 2003, no Remate 3 Gerações, Seu Trajano Silva se despediu do martelo e passou a função para os filhos Marcelo e Vadico e o neto Gonçalo. Na ocasião, foi instituída a data 27 de setembro como o Dia Nacional do Leiloeiro Rural. Em 2010, a Trajano Silva Remates completou 50 anos e realizou um leilão histórico da raça crioula, no Hotel Plaza São Rafael, em Porto Alegre (RS), com faturamento recorde de R$ 3,35 milhões.

Essas são apenas algumas das inúmeras recordações que estão eternizadas na memória e no coração de Marcelo Silva. “São muitos os momentos mágicos e de alegria que vivenciei. O mais importante disso tudo é que aprendi a dar valor à minha família, aos amigos e aos nossos colaboradores. Sem eles, não seria uma pessoa feliz e realizada”, garante Marcelo Silva.

O patriarca, Trajano Silva, juntamente com os dois filhos leiloeiros: Marcelo e Vadico

Três gerações com a mesma vocação

CABANHA DON MARCELINO:

O cavalo crioulo, raça símbolo do Rio Grande do Sul, também conquistou o leiloeiro Marcelo Silva. Em homenagem ao avô materno, a cabanha chama-se Don Marcelino e está localizada em Lavras do Sul (RS). Foi desse plantel que saiu a égua Freio de Ouro 2003: Entrosada do Junco.  “O cavalo crioulo é a grande paixão dos gaúchos. Uma raça que é protagonista da história do nosso estado e que, com o passar dos anos, rompeu fronteiras. Atualmente, está disseminada de Norte à Sul. Eu comecei a criar crioulo, em 1981, que foi o mesmo ano do nascimento do Gonçalo. De lá para cá, a raça só me deu alegrias”, diz Marcelo Silva.

TRAJANO SILVA REMATES:

Desde 1977, Marcelo Silva é o diretor da Trajano Silva Remates, leiloeira líder na comercialização de bovinos das raças européias e de cavalo crioulo.  No ano passado, os leilões promovidos pela Trajano movimentaram mais de R$ 63 milhões e só a raça crioula foi responsável pela receita de R$ 41,17 milhões.

Os leilões de cavalo crioulo representam, em média, 60% do faturamento da Trajano Silva Remates

Freio de Ouro 2003: Entrosada do Junco, da família de Marcelo, carinhosamente chamada de “petiça”

CANAL RURAL:

O Canal Rural sempre foi um grande parceiro da Trajano Silva Remates e segundo o leiloeiro Marcelo Silva, a história dos leilões no Brasil pode ser dividida em antes e pós as transmissões ao vivo pela televisão.  “A história dos leilões antes da chegada do Canal Rural é uma. E após o início das transmissões é outra. A emissora mudou completamente a cara dos leilões no País e, indiscutivelmente, essa mudança foi para melhor. Devido a tremenda abrangência passamos a contar com compradores de todas as regiões do Brasil e de países da América do Sul. O Canal Rural foi um grande difusor dessa modalidade de vendas consolidada na pecuária nacional”, reconhece Marcelo Silva.

O FUTURO DA DINASTIA DE LEILOEIROS:

Marcelo Silva tem um netinho, o Benício, filho do Gonçalo. Se a tradição for seguida, em breve, a quinta geração de leiloeiros rurais da família estará com o martelo em mãos dando sequência a um antigo sonho, que se tornou realidade pois não foi sonhado sozinho. Ou seja, a dinastia será mantida enquanto esse for o sonho dos novos herdeiros da família Silva. “O futuro a Deus pertence, mas é claro que ficarei muito feliz se o Benício seguir os passos do pai, avô, bisavô…O tempo passa tão rápido, mas creio que ele seja nosso aliado. Tanto que se eu pudesse voltar no tempo, gostaria de ter aos 30 anos, a experiência e a sabedoria que tenho hoje. Mas, como isso não é possível, espero transmitir todo o conhecimento que adquiri para os meus netos.  É a vida que segue e se renova a cada geração”, conclui Marcelo Silva. Como já é de costume, essa “renovação” vem a galope e sempre é repassada de mestre para discípulo!

Cultivando o amor e as tradições rurais: Marcelo, Gonçalo, Benício e o cavalo crioulo

Por Paula Sant’Ana | Canal Rural

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